Um dos argumentos mais utilizados pelos planos de saúde (e o próprio Estado) para negar cobertura de medicamento é o fato do mesmo ser considerado off-label.
O medicamento chamado off-label é aquele cuja indicação do profissional assistente diverge do que consta na bula. Já o material off-label é aquele cuja indicação de profissional assistente diverge do que consta no manual de uso do material.
Segundo a Resolução normativa n. 424 de 2017 da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, não cabe junta médica, pois o medicamento e material cuja indicação clínica seja diferente daquela do registro efetuado pela Anvisa não são de cobertura obrigatória pelas operadoras.
Uma vez comercializado o medicamento, enquanto as novas indicações não são aprovadas, seja porque as evidências para tal ainda não estão completas, ou porque a agência reguladora ainda as está avaliando, é possível que um médico já queira prescrever o medicamento para um seu paciente que tenha uma delas. Podem também ocorrer situações de um médico querer tratar pacientes que tenham uma certa condição que, por analogia com outra semelhante, ou por base fisiopatológica, ele acredite possam vir a se beneficiar de um determinado medicamento não aprovado para ela.
Quando o medicamento é empregado nas situações descritas acima está caracterizado o uso off label do medicamento, ou seja, o uso não aprovado, que não consta da bula. A classificação de uma indicação como off label pode, pois, variar temporalmente e de lugar para lugar. O uso off label é, por definição, não autorizado por uma agência reguladora, mas isso não implica que seja incorreto.
É bem verdade que a Lei n. 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde) estabelece, em seu art. 10, I, que os planos de saúde não estão obrigados a fornecer aos seus beneficiários tratamento experimental, entendido este, nos termos da Resolução n. 338/2013 da ANS, como aquele que: "a) emprega medicamentos, produtos para a saúde ou técnicas não registrados/não regularizados no país; b) é considerado experimental pelo Conselho Federal de Medicina - CFM ou pelo Conselho Federal de Odontologia- CFO; ou c) não possui as indicações descritas na bula/manual registrado na ANVISA (uso off-label)".
Entretanto, os tribunais brasileiros, vem entendendo que não se mostra razoável e nem jurídico negar ao paciente o custeio do referido medicamento, ainda que seja considerado experimental ou que não esteja contemplado no rol da ANS. Se existe a possibilidade de melhora na saúde da paciente, por certo, o procedimento não pode ser negado, inclusive porque o rol da ANS possui caráter exemplificativo e não taxativo.
Sobre esse aspecto, merecem transcrição os relevantes argumentos lançados pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 668.216/SP:
A orientação que se vem firmando, e que merece exame da Corte, é sobre esse ponto, considerando a consolidação legislativa vigente com a Lei n° 9.656/98. O que se procurou fazer, pelo menos no meu entender, foi estabelecer critério para proteger o consumidor e ao mesmo tempo assegurar a viabilidade empresarial dos planos privados de saúde. De fato, não se pode negar o direito do contrato de estabelecer que tipo de doença está ao alcance do plano oferecido. Todavia, entendo que deve haver uma distinção entre a patologia alcançada e a terapia. Não me parece razoável que se exclua determinada opção terapêutica se a doença está agasalhada no contrato. Isso quer dizer que se o plano está destinado a cobrir despesas relativas ao tratamento, o que o contrato pode dispor é sobre as patologias cobertas, não sobre o tipo de tratamento para cada patologia alcançada pelo contrato. Na verdade, se não fosse assim, estar-se-ia autorizando que a empresa se substituísse aos médicos na escolha da terapia adequada de acordo com o plano de cobertura do paciente. E isso, pelo menos na minha avaliação, é incongruente com o sistema de assistência à saúde, porquanto quem é senhor do tratamento é o especialista, ou seja, o médico que não pode ser impedido de escolher a alternativa que melhor convém à cura do paciente. Além de representar severo risco para a vida do consumidor. [...] Nesse sentido, parece-me que a abusividade da cláusula reside exatamente nesse preciso aspecto, qual seja, não pode o paciente, consumidor do plano de saúde, ser impedido de receber tratamento com o método mais moderno do momento em que instalada a doença coberta em razão de cláusula limitativa. É preciso ficar bem claro que o médico, e não o plano de saúde, é responsável pela orientação terapêutica. Entender de modo diverso põe em risco a vida do consumidor. (Grifou-se)
Desta forma, verifica-se que o que prevalece em hipóteses tais é a existência de previsão contratual de cobertura para a patologia e não a forma como o tratamento será feito, pois não é dado aos planos de saúde estabelecer os procedimentos médicos que devem ser observados.
Conclui-se, assim, que mesmo nos casos de medicamento off label o dever de cobertura (ou não) deve ser avaliado de acordo com o caso concreto, pois, vai depender da existência de outros métodos ou fármacos que possuem eficácia comprovada para a patologia em questão, da especialidade médica, da gravidade da doença, entre outros fatores.
Fonte: REsp n. 668.216/SP, ANS, ANVISA.
SIGA-NOS