O assunto já havia sido tratado pelo Superior Tribunal de Justiça na edição n. 74 do Jurisprudência em Teses, que teve como tema o direito do consumidor. Na época, a tese n. 17 delimitou que não há incidência da legislação consumerista nos contratos de plano de saúde administrado por entidades de autogestão, em razão de inexistir relação de consumo.
Ocorre que, em recente publicação do periódico (edição nº 143), que trata de planos de saúde, foi retomada a discussão acerca da matéria na Tese n. 1.
Um dos julgados que gerou precedentes na corte foi o REsp 1766181/PR.
O recurso teve como origem uma ação de obrigação de fazer c/c danos morais, movida por servidora pública em desfavor de autarquia municipal de previdência social. Durante o trâmite do processo, a autora reiteradamente requereu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor no caso, a fim de obter êxito na demanda.
No julgamento do REsp, a relatora Ministra Nancy Andrighi,conheceu em parte o recurso especial e lhe negou provimento, afirmando que ao caso não se aplicaria a Lei dos Planos de Saúde (Lei n. 9.656/1998), nem o CDC.
Merece destaque as observações realizadas pela Ministra quanto a não aplicabilidade da legislação consumerista às entidades de autogestão, em razão de possuírem determinadas características, que as diferenciam dos planos privados de assistência à saúde, lista-se:
i) não possuir fins lucrativos; ii) não ser exigível que ofereça plano-referência (art. 10, §3º, da LPS); iii) não disponibilizar o produto no mercado de consumo para qualquer pessoa; iv) haver solidariedade na administração da carteira, com interferência direta das coberturas e restrições contratuais.
Os Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Paulo de Tarso Sanseverino, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro também negaram provimento ao recurso, entretanto por fundamentos diversos. Em divergência ao entendimento da Relatora, julgaram ser aplicável ao caso, a Lei n. 9.656/98. Entretanto, concordaram com a não incidência do Código de Defesa do Consumidor, a teor da Súmula n. 608 do STJ: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.”.
Apesar de não se aplicar o CDC, a abusividade fora analisada sobre outra óptica, entretanto, ainda assim, ao Recurso Especial foi negado provimento, porquanto os julgadores entenderam que, neste caso específico, a negativa do plano de saúde de prestar o serviço pleiteado na ação não foi abusiva, razão pela qual a parte autora sucumbiu.
Mas, o que é entidade de autogestão?
A definição de autogestão encontra-se elencada no art. 2º da Resolução Normativa – RN n° 137[1], de 14 de novembro de 2006:
Art. 2º Para efeito desta resolução, define-se como operadora de planos privados de assistência à saúde na modalidade de autogestão:
I – a pessoa jurídica de direito privado que, por intermédio de seu departamento de recursos humanos ou órgão assemelhado, opera plano privado de assistência à saúde exclusivamente aos seguintes beneficiários:
a) sócios da pessoa jurídica;
b) administradores e ex-administradores da entidade de autogestão;
c) empregados e ex-empregados da entidade de autogestão;
d) aposentados que tenham sido vinculados anteriormente à entidade de autogestão;
e) pensionistas dos beneficiários descritos nas alíneas anteriores;
f) grupo familiar até o quarto grau de parentesco consanguíneo, até o segundo grau de parentesco por afinidade, criança ou adolescente sob guarda ou tutela, curatelado, cônjuge ou companheiro dos beneficiários descritos nas alíneas anteriores.
II – a pessoa jurídica de direito privado de fins não econômicos que, vinculada à entidade pública ou privada patrocinadora, instituidora ou mantenedora, opera plano privado de assistência à saúde exclusivamente aos seguintes beneficiários:
a) empregados e servidores públicos ativos da entidade pública patrocinadora;
b) empregados e servidores públicos aposentados da entidade pública patrocinadora;
c) ex-empregados e ex-servidores públicos da entidade pública patrocinadora;
d) pensionistas dos beneficiários descritos nas alíneas anteriores;
e) sócios ou associados da entidade privada patrocinadora ou mantenedora da entidade de autogestão;
f) empregados e ex-empregados, administradores e ex-administradores da entidade privada patrocinadora ou mantenedora da entidade de autogestão;
g) empregados, ex-empregados, administradores e ex-administradores da própria entidade de autogestão;
h) aposentados que tenham sido vinculados anteriormente à própria entidade de autogestão ou a sua entidade patrocinadora ou mantenedora;
i)pensionistas dos beneficiários descritos nas alíneas anteriores;
j) grupo familiar até o quarto grau de parentesco consangüíneo, até o segundo grau de parentesco por afinidade, criança ou adolescente sob guarda ou tutela, curatelado, cônjuge ou companheiro dos beneficiários descritos nas alíneas anteriores;
k) as pessoas previstas nas alíneas "e", "f", "h", "i"e "j" vinculadas ao instituidor desde que este também seja patrocinador ou mantenedor da entidade de autogestão; ou
III - pessoa jurídica de direito privado de fins não econômicos, constituída sob a forma de associação ou fundação, que opera plano privado de assistência à saúde aos integrantes de determinada categoria profissional que sejam seus associados ou associados de seu instituidor, e aos seguintes beneficiários:
a) empregados, ex-empregados, administradores e ex-administradores da própria entidade de autogestão;
b) aposentados que tenham sido vinculados anteriormente à própria entidade de autogestão;
c) pensionistas dos beneficiários descritos nas alíneas anteriores; e
d) grupo familiar até o quarto grau de parentesco consangüíneo, até o segundo grau de parentesco por afinidade, criança ou adolescente sob guarda ou tutela, curatelado, cônjuge ou companheiro dos beneficiários descritos nas alíneas anteriores.
Por fim, para concluir a elucidação da matéria, traz-se também o conceito de Plano Privado de Assistência à Saúde, previsto no art. 1º, inciso I, da Lei n. 9.656/98[2]:
Art. 1º. Submetem-se às disposições desta Lei as pessoas jurídicas de direito privado que operam planos de assistência à saúde, sem prejuízo do cumprimento da legislação específica que rege a sua atividade, adotando-se, para fins de aplicação das normas aqui estabelecidas, as seguintes definições:
I - Plano Privado de Assistência à Saúde: prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor;
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):
REsp 1766181/PR
[1] Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?view=legislacao&task= TextoLei&format=raw&id=MTExNw==
[2] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9656.htm
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